-O Enigmata- Por Cecília Barriga

Devo confessar meu estranhamento ao vê-lo a cada crepúsculo colocando óculos, peruca e cachecol... Até mesmo no verão! Saía diariamente em linha reta, às vezes em disparada para o centro do parque, mas quando lhe dava na telha, retornava dois passos e ali mesmo ficava. Com suas duas únicas mãos, retirava tudo quanto era quinquilharia dos bolsos de seu casaco roxo com manchas azuis, verdes e de cores que não existiam.

Para ele, suas quinquilharias eram importantes ferramentas de trabalho!

Ponto primeiro: Um equipamento ultramoderno para os entendidos na área de sensibilidade espontânea – O incrível ‘escritospoetatizador’ com raio-laser!

Ponto segundo: A atualíssima máquina registradora de caretas e expressões de quem é especialista em pedir para ficar mais um pouquinho no parque – A maravilhosa ‘estiqueepuxesorrindorizadora’ de uma famosa marca alemã!

Ponto terceiro: Esse tinha sido um presente dado por seu avô nos seus treze, quatorze, quinze, dezesseis ou dezessete anos, não sei bem em qual idade, mas que faz tempo isso faz – Uma máquina fotográfica! Dizem os mais ‘distantes’, que estava quebrada há mais de cinqüenta anos!

E lá se ia aquele que no meio de toda àquela multidão, despercebido quase não ficava!
O seu ofício começava quando todas aquelas quinquilharias, ops! Desculpa! Quando todas aquelas importantes ferramentas de trabalho eram por ele retiradas cuidadosamente dos bolsos depois de tanta caminhada bem dada, lugar minuciosamente escolhido, temperatura medida com o dedo molhado na boca mesmo e posto no ar... Ele, o Enigmata, estático bem no meio do parque, de olhos fechados e com a máquina fotográfica em punho, dava nada menos que três suspiros antes de começar a sessão fotográfica!

O mais incrível é que jamais o vi tirando fotos com olhos abertos!

Há uma infinita possibilidade de retratos ao nosso redor, em nós e bem na ponta do nosso nariz... Podemos dividir o que vemos e não vemos em minúsculos quadradinhos, tudo se pode reduzir em quatro lados!
Bolinhas de sabão, de perto, se tornarão quadrados de sabão. O céu, em poças d’água, vira chão. E se a fotografia pega somente a mão de alguém, consigo assim ver todos os emes, dáblios, ês, três... Um dia eu vi até um cê!
O meu trabalho não é muito diferente ao de um poeta... A grandeza deste ofício está no acaso!
É no acaso que eu me revelo!
No caso do poeta, as palavras no papel fazem com que imagens sejam reveladas ali, em quatro lados de uma antiga folha em branco... Assim como ela, faço com que minha fotografia tenha mil possibilidades de ser concebida ao embalo do acaso e de meus olhos, que fechados, dão mais asas ao meu olhar!
E a revelação de minhas inesperadas imagens é melhor que festa de aniversário surpresa, melhor que telefonema da pessoa que a gente tem um amor escondidinho só no nosso coração ou até mesmo em tirar um dez numa prova que a gente acredita ter se saído tão mal... É um fruto do acaso, do desconhecido, do escondido. Só quando a fotografia é revelada é que descubro o que estava ao meu redor naquele instante registrado. O que estava bem pertinho de mim e eu não avistara. É assim que começo a desvelar o meu mundo, o qual começo a inventar com alguns improvisos!
E quando uma sensação de perda vem chegando, aciono o meu incrível ‘escritospoetatizador’ com raio-laser e o cenário é novamente reajustado e reenquadrado nos quatro lados de uma folha em branco.
Falando em folha em branco, hoje revelei uma imagem interessantíssima aos conhecedores de acasos achados ou perdidos. A foto que há pouco revelei, tinha algo parecido com um diário e suas páginas pareciam asas e ele estava voando no momento que o registrei. Estou fascinado, era um pássaro de palavras aladas!!!
Como estou ocupadíssimo revelando as setenta e sete fotos de hoje, acho que agora terei que me despedir de vocês. É complicadíssimo o trabalho de um seriíssimo profissional como eu, requisitadíssimo por imagens que geralmente não são fotografadas ou sensibilizadas em pessoas mais ‘distantes’.
Opa! O que vejo aqui? O que está me aparecendo?
Não acredito que está havendo uma rebelião das palavras... Todas me aparecem aladas nessas fotografias!
Há mais páginas no céu do que se imagina...
Agora estou realmente atolado de serviço. Preciso conferir a temperatura antes que minhas fotos também decidam se tornar aladas!

Ao retornar em disparada para o centro do parque, o Enigmata com seus cinco dedos da mão direita e com os outros cinco da esquerda, encharcados com algumas babinhas, ergue suas mãos para assim medir a temperatura. E como em todos os dias, retira novamente todas as suas importantes ferramentas de trabalho dos bolsos e recomeça o seu intrigante ofício.

3 idéia(s):

eu escrevi o meu capitulo tem duas semanas
e nao consigo achar ningueeeeeeeeeeeemmmmmmmm
o capitulo de isis lendo o diario de iris...

2 de dezembro de 2008 às 04:17  

Amigos escritores, este texto já está no outro blog com novos ajustes! Um beijo, Cecília.

3 de dezembro de 2008 às 09:36  

Fábio, acredito que devas postar este comentário no nosso 'Diálogos', aliás, não compreendi a tua dúvida em não ter encontrado ninguém. Um abraço!

3 de dezembro de 2008 às 09:38  

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